* Breno Rosostolato é professor de psicologia da Faculdade Santa Marcelina – FASM.
O povo brasileiro é cordial, sempre escutei isso desde que me conheço por gente. A maioria dos estrangeiros nos vê como simpáticos, acolhedores, alegres, festeiros, a exemplo do que pudemos constatar na Copa do Mundo.
Mas esta cordialidade não revela, de fato, a verdade, a intenção e o pensamento por de trás da imagem transmitida. Cordialidade que serve, muitas vezes, de fachada, assim como afirma o sociólogo Antônio Cândido: “O homem cordial não pressupõe bondade, mas somente o predomínio dos comportamentos de aparência afetiva”.
O Brasil é um país que se revela cada vez mais reacionário através de seu povo e dá inúmeros exemplos para sustentar esta triste realidade. As eleições de 2014 é o exemplo mais recente. As pessoas discutem e manifestam suas opiniões partidárias, se esforçando com inúmeros argumentos. Formulam teorias, desde as mais simplórias, denunciando falta de conhecimento sobre aquilo que defendem, até teorias conspiratórias, embasadas no medo e, possivelmente, na mesma falta de conhecimento. Muitos são ponderados, demonstrando preocupação com o rumo do país e fomentando boas e saudáveis discussões.
Infelizmente, o que tem acontecido nas redes sociais são uma verdadeira segregação e a manifestação explícita do ódio. Um binarismo entre bem e mal, pobres e ricos, Norte e Nordeste contra Sudeste e Sul. Visões deturpadas e violentas do outro que não deve ser entendido como rival ou inimigo, mas cuja opinião deve ser preservada e respeitada. Ter uma posição diferente da sua não deveria ser ameaçador. Se for, talvez o problema esteja em você, afinal a diferença é agregadora e não segregadora e são as suas limitações que não o permite sustentar esta diferença.
Somos uma sociedade de pessoas que se esforçam para ser simpáticos, mas não empáticos. Retórica enfatizada por Karnal. O amor e ódio, que andam lado a lado, são a representação clara da dualidade emocional e que sustenta nossa contradição. Escutamos a opinião do outro, mas, às costas dele, criticamos e detestamos o que acabamos de escutar. Uma raiva que surge pela discórdia que cresce até virar ódio. Mas que está sempre nele e não em mim. Freud explica. É a morte na própria vaidade e no narcisismo descontrolado.
A intolerância à diferença é traduzida na necessidade doentia de tornar o outro igual, desqualificando suas opiniões e diminuindo-o como ser humano. Expressar a própria opinião e ter um posicionamento distinto é recriminado como algo errado. Eu não posso ser eu, tenho que ser o outro senão sou retalhado. Entretanto, é a diferença do outro que cria reflexo em nós e favorece o autoconhecimento.
Depois da reeleição da presidente Dilma Rousseff, as redes sociais foram bombardeadas com insultos, comentários racistas e xenófobos contra os nordestinos. Uma confusão entre preconceito e ressentimento social com liberdade de expressão. Mas o ódio é tão contundente que leva as pessoas, facilmente, a mostrar o que elas possuem de pior.
O ódio cria unidade e agrupa as pessoas, pois é difícil amar, embora nos esforcemos, mas odiar é prazeroso, mesmo que sádico. Somos diferentes, mas se temos a quem odiar, nos tornamos irmãos, como bem evidencia o historiador Leandro Karnal.
François de La Rochefoucauld, aristocrata e moralista francês nos brinda com uma frase: “Nada é tão contagioso como o exemplo”. De fato, muitos que expressam seu ódio nas redes sociais se fortalecem à medida que ganham seguidores. Querem ser exemplos e enaltecidos como tal, na eloquência de pensamentos enfadonhos e na efervescência de seu desequilíbrio emocional, contagiando seus cúmplices com o pior que eles tem a oferecer. Talvez, de fato, não exista amor no Brasil.