É muito comum que haja intervenções profissionais sobre as famílias, seja em escolas, consultórios, instituições de acolhimento, etc. Todavia, ressalta-se aqui que não há uma “receita de bolo” que possa ser ditada por qualquer especialista que seja. A importância das mais diversas disciplinas e seus profissionais correspondentes está muito mais no acolhimento às famílias e crianças que estão em sofrimento do que no ditado de regras sobre que modelo familiar deve se seguir, que modos de relacionamento deve-se ter com os filhos. Cabe ainda a estes profissionais que trabalhem sempre na direção da compreensão sem julgamentos normativos, que qualifiquem famílias sem considerar seus contextos, além de diálogo permanente entre si visando o acolhimento orientador e com participação ativa dos protagonistas, nunca padronizador. A conjugação do verbo “dever” é quem deveria se ausentar quando se acolhe ou atende uma família em sofrimento na relação pais, mães e crianças, o que pode se expandir para a família estendida responsável pela criação ou até mesmo por profissionais de educação que exercem papel importantíssimo no desenvolvimento de crianças. Há o dever estabelecido pelo Estatuto da Criança e do Adolescente e há o cuidado, em se prover as condições mínimas para que se crie um sujeito biológica, física e psiquicamente saudável, provendo-lhe a existência de seus desejos desatrelados daqueles da família em sua singularidade. O ideal não existe. Ele está no mundo das ideias. Criar filhos é uma tarefa árdua àqueles que se dispõem a ela. Parentalidade significa a transmissão de valores culturais e um conjunto de símbolos que uma geração deixa à outra, e isto remete a um conflito muito grande de desejos. Desejos da criança, um sujeito que a cada dia se forma e se individualiza em sua subjetividade e individualidade, e desejos da família, que fantasia e vislumbra todo um futuro para este pequeno ser (ou não, infelizmente). Compreender que cada um tem uma função dentro da formação familiar é de extrema importância, não importa qual modelo de família estamos falando. Quando falamos de função materna, não estamos destinando e engessando à mãe os cuidados da criança, assim como a função paterna pode ser exercida tranquilamente sem ser pelo genitor da criança. Fora de uma norma e de um padrão sobre como deve ser uma família para que a criança cresça da forma “adequada” (a quê?), é mais preciso que pensemos como a família em que a criança se inseriu pode acolhê-la de modo a constituir sua subjetividade e sua formação psíquica, não importando o modelo familiar. Todas as pessoas podem e devem ter direitos a formarem suas famílias sem serem classificadas ou julgadas por qualquer área profissional.