Proprietária do Hotel Fazenda Foz do Marinheiro, desde 1999, ela conta detalhes da transformação do local em sua vida
Valéria Foz está há 25 anos em Cardoso (Foto: Arquivo Pessoal)
* Por Valéria Foz
Eu não tinha ideia de onde estava Cardoso no mapa e sequer
sabia de sua existência. Numa tarde, a convite de meu pai Milton Soares Minhos,
já falecido, e meu marido Wilson de Sousa Foz, viemos para Cardoso com nosso
filho Thomaz Minhos Foz, que na época tinha 2 anos, e Eleonora Minhos Branco, 3
anos, e Alberto Minhos Branco, 5 anos, meus sobrinhos amados.
Viemos para conhecer o loteamento Beira Rio, obra de
agrimensura e projeto de meu pai. Meu cunhado Alberto Branco, minha irmã Ana
Paula Minhos Branco e minha mãe Edna Pedrazoli Minhos vieram para nós
acompanhar. Meu pai tinha um terreno e meu marido, apaixonado pela beleza do
local, propôs a sociedade. Mas, felizmente, a casa merecia um local maior.
Ao cair do sol, que considero o pôr de sol mais belo do
mundo, logo veio a ideia!
- Quero um local maior na região, compro a casa e teremos um
dos lugares mais aprazíveis do mundo.
Tudo certo se não morássemos em São Paulo e nossa vida fosse
toda lá. Enfim, durante uma viagem de 40 dias pelo interior da França, ainda na
época do fax, recebemos um fax comunicando o achado: 30 alqueires em frente à
represa e em frente ao loteamento.
Meu marido imediatamente aceitou a proposta sem ver e sem
pensar e, juntamente de meu cunhado, comprou a casa. A felicidade era muita, as
crianças haviam se apaixonado pela Vila de São João do Marinheiro, distrito de
Cardoso, uma pequena vila pitoresca de pescadores, onde brincaram na praça,
tomaram sorvete e tiveram uma tarde inesquecível.
Iniciamos, então, nossa história com a cidade de Cardoso. Foram
tempos inesquecíveis, vínhamos para cá e ficávamos três meses, sem TV (ficamos
até hoje), não trazíamos brinquedos para as crianças. A vida teria que ser
vivida com os recursos da natureza. Fomos aprendendo passo a passo como era a
vida deste lugar.
Nossos primeiros amigos foram:
O Dr. Hélio veterinário, com quem eu passava todas as manhãs
batendo papo e aprendendo muito. A Kelly Trindade, que foi a primeira mulher a
vencer as provas de tambor em festas do peão. Aprendi muito com ela, às vezes
passava a tarde vendo-a treinar e cuidar de seu plantel.
A consequência foi a grande amizade com seus pais Aloisio
Trindade e Marlene, que me acolheram e me ensinaram muito, eu adorava as
conversas ao final da tarde. Dona Lourdes Borges, que tanto admirei. Me
encantei e sofri com sua história: quando a represa encheu, ela e seu marido viram
suas terras se afundarem. Álvaro Shiotta, que assumiu a veterinária da fazenda.
O Hildo Pimenta, que foi nosso administrador por tantos
anos, junto com seu pai, que chamávamos de "homem do dedo verde",
onde tudo que plantava dava frutos. O Tiãozinho, que era meu funcionário e
parceiro quando tínhamos o haras. Passávamos horas sentados no chão contando
histórias e dando risadas .
Meus filhos...nem se fala. Quando chegávamos, já pegávamos o
Geandro, filho do Pimenta, e alguns meninos da vila, que passavam os três meses
em minha casa a brincar sem trégua. Meu lema era "criança limpa não entra
em casa". Imagina como eles chegavam! O rio marinheiro, a 100 metros de
casa, um braço do rio Grande, nosso filho conhecia cada metro. Temos histórias
incríveis, que não vêm ao caso agora.
Com a oscilação da represa, que é muito grande, chegamos a
pegar os tijolos da antiga sede, que igualmente foi afundada. As pescarias eram
incríveis, eles saíam e voltavam com tantos peixes que chegávamos a não ter
onde armazenar. Cardoso era (é) uma pequena cidade caipira do interior noroeste
do Estado do São Paulo. E foi isto que nos fez ficarmos encantados por ela.
Com um potencial turístico imenso e que pode ser muito
importante, assim como as pequenas cidades da Europa que visitamos e saímos
encantados, onde aprendemos sobre a vida, a realidade das pessoas, seus
prazeres e sofrimentos, assim é Cardoso, no Brasil, interior de São Paulo.
Cardoso nos fisgou, sem planejamento para nada, numa
consequência da vida. Tivemos boi, vacas e um haras, que acabei transformando
em uma pousada para pescador, com apenas quatro apartamentos. E hoje tenho o
Hotel Fazenda Foz do Marinheiro, com 60 apartamentos.
Consegui, numa busca incessante, fazer Cardoso entrar em
todos os portais, sites, feiras, guias, operadoras e agências de turismo. Uma
luta vitoriosa. Estamos em Cardoso há 25 anos e com o hotel desde 1999. Vejo um
pequeno amadurecimento em relação ao turismo, mas uma grande esperança que este
sonho torne realidade.
Temos trazido milhares de turistas, que saem encantados com
a simpatia, o acolhimento, o carinho, o sorriso das pessoas da nossa região. A
gastronomia é o carro chefe de tudo, à base de peixe, galinha, cordeiro e vaca.
Quando chegamos, poucos jovens eram estudados. Hoje temos
faculdades das cidades vizinhas, que facilitam esta condição, inclusive com
transporte oferecido pela cidade. Isto faz a cidade crescer e melhora a mão de
obra.
Uma visita a Cardoso pode ser um programa muito interessante
e acabei fazendo-o em um dia com esta visão. Adorei e acabei vendo mais do que
minha previsão dizia. Iniciei o passeio no ponto de táxi na praça central, onde
foram colocadas algumas fotos do início da cidade, que ilustram seu
desenvolvimento.
Passei pelo ponto zero, onde está o cruzeiro inicial da
cidade, onde foi rezada a primeira missa. Hoje os eventos festivos, como
festival de ballet de alto nível ou eventos musicais sertanejos, são feitos na
praça que recebe a população, que faz questão de prestigiar. Passei na igreja
com sua arquitetura própria. Como não poderia deixar de existir, vi a fonte
luminosa, que hoje não funciona, mas está lá para ser admirada.
A praça arborizada é o centro de tudo, o comércio está ao
redor e nela uma praça de food trucks muito original, com o pastel mais gostoso
da região, onde as pessoas fazem happy hour ao entardecer. O carrinho da garapa
fresquinha feita na hora é seguida de um papo simpático e pitoresco, o carrinho
de sorvete, o carrinho do coco gelado e o caminhão que vende flores e plantas
todas as sextas feiras.
Tudo isto faz parte da cidade e merece ser visto e vivido. É
uma cultura que devemos conhecer, pois é parte de nossa história. Ao redor
estão os dois únicos bancos, as quatro farmácias, a padaria, a sorveteria e as
demais lojas da cidade.
Saímos de lá e fomos para a prainha na beira do rio, que
está sendo revitalizada. Ela oferecerá o lazer em quiosques, com estrutura para
o churrasco, o banho e uma tarde animada à beira do rio. Na margem da represa,
vemos aves incríveis, que já estão mansas e acostumadas com a movimentação,
pois se alimentam das vísceras dos peixes limpos pelos pescadores.
Na prainha, vimos alguns festivais de pescas, festas da
padroeira, desfiles de barcos e, durante nossa visita, a arrumação para a festa
do Carnaval de 2017. O local tem pista de passeio e lá também estão os food
trucks e as pessoas se divertindo à beira da calçada.
Fomos para uma das estradas da cidade, onde o portal é
realmente interessante e representa a vida do local. Num desenho moderno, uma
vara de pescar que carrega um tucunaré, peixe da região, fisgado por um anzol. Andando
mais um pouco, a estrada bem arborizada dos dois lados da passagem aos atletas
da tarde, que vão para lá para as caminhadas e corridas. Uma paisagem de tirar
o fôlego, entre árvores, o pôr do sol e ainda algumas fazendas de gado e
seringueiras.
Uma paradinha para o café foi no posto do Rafa, onde tem uma
conveniência. As pessoas se dividem entre outros postos de gasolina para a
cervejinha bem gelada do final do dia, uma tradição que você vê a cada esquina
da cidade.
Passamos pela praça onde está a Santa Casa, hoje referência
em cirurgias de cataratas, recebendo gente de toda a região para realizar o
sonho de voltar a enxergar. Um projeto audacioso para uma cidade no interior do
Estado, admirável. A praça é bastante arborizada e oferece algum lazer para as
crianças, como parquinho e outros.
Um ponto a ser visitado é a lagoa com seu deck de madeira e
a cachoeira que enfeita e refresca a cidade, que é sempre quente e com inverno
pouco rigoroso, dando ainda mais oportunidade ao turismo e ao rio.
Entre sorveterias simples, mas com sabores incríveis, agora
temos a moderna Mela Guela, que o nome realmente é marca da cultura da cidade e
claro que fomos saborear e conhecer estas delícias com muitos sabores, pois a
sorveteria da praça é nossa velha conhecida de 25 anos e a Sonho De Verão, que
nos abasteceu por muitos anos em nosso Foz do Marinheiro.
Na cidade, há três hotéis para viajantes com conforto, ar
condicionado e bom atendimento. Enfim, vir para Cardoso é conhecer um mundo que
hoje não vemos mais e é exatamente isto que faz da cidade um local
interessante. Venha e comprove você mesmo. Estamos a apenas 1h30 do aeroporto
mais próximo de São José do Rio Preto. As estradas são ótimas, com duas pistas
e infraestrutura.
Venha, estamos te esperando!
* Valéria Foz é referência como empreendedora no setor de ecoturismo. Formada em Arquitetura, ela é diretora do Hotel Fazenda Foz do Marinheiro, que fica na cidade de Cardoso.