Apesar da sanção da recente Lei nº 14.944/24, que busca estabelecer diretrizes para o uso do fogo em áreas rurais, com foco na sustentabilidade e na proteção da biodiversidade, a subjetividade da lei e a falta de clareza em suas diretrizes deixaram margens para questionamentos quanto à sua aplicabilidade e, agora, diante do cenário das queimadas que se alastram pelo país, segue sem trazer claras definições de ordem prática.
Recentemente ocorreu a divulgação de dados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) sobre o aumento de 78% nas queimadas no Brasil em 2024, em comparação com o mesmo período do ano anterior, acendendo assim, um alerta vermelho para a situação ambiental do país. De 1º de janeiro a 26 de agosto de 2024, foram registrados 109.943 focos de incêndio no Brasil, um salto significativo em relação aos 61.720 casos contabilizados no mesmo período do ano anterior.
As regiões mais críticas são Mato Grosso, com 21.694 ocorrências, e Pará, com quase 15 mil casos. O governo paraense, em uma tentativa de conter a situação, declarou emergência ambiental na terça-feira (27/08), proibindo o uso de fogo para limpeza de terrenos e pastagens – prática permitida desde que autorizada pelo órgão ambiental competente.
Este cenário nos remete a dois momentos históricos que marcaram a luta ambiental no Brasil. Em 1988, o país vivenciou um dos maiores incêndios florestais da história na Amazônia, que resultou na perda de aproximadamente 20% da floresta e que culminou com a criação da Lei de Crimes Ambientais. E, em 2019, quando as queimadas na Amazônia ganharam repercussão internacional, colocando o Brasil no centro das discussões sobre mudanças climáticas.
Neste contexto, surgiu o PL 1818/2022, que foi sancionado como Lei nº 14.944/24, como uma possível solução para mitigar os impactos das queimadas. A proposta tentou promover a inovação tecnológica para o monitoramento e combate aos incêndios florestais, além de estabelecer medidas de prevenção e controle. A ideia, então, era utilizar a tecnologia como aliada na luta contra as queimadas, através do uso de satélites, drones e inteligência artificial. Entretanto, diante dos últimos acontecimentos, podemos verificar que a tecnologia por si só não vem sendo suficiente para resolver o problema.
Por exemplo, na última semana de agosto, o Estado de São Paulo vem sofrendo com diversos focos de incêndios que causaram devastação de plantações até fechamento de rodovias – o poder executivo, inclusive, criou um gabinete de crise para lidar com a situação.
O secretário Nacional de Proteção e Defesa Civil, Wolnei Wolff, disse que 99,9% dos incêndios registrados no Estado foram causados por ação humana.
De acordo com o artigo 250 do Código Penal, queimar qualquer coisa em ambiente aberto é considerado crime, além de causar problemas à saúde e uma vasta poluição. A pena para esta prática, caso seja realizada ilegalmente, é de 3 meses a 6 anos, mais multa. Além disso, a Lei Federal nº 9.605, de 1998 e o Decreto Federal nº 6.514, de 2008, definem a realização de queimadas como um ato proibido, principalmente se coloca em risco a saúde humana, a vegetação e os animais, o que pode gerar multas de R$ 50 a R$ 50 milhões.
O ministro Flávio Dino determinou, em 27/08, que a União mobilize, em até 15 dias, o maior contingente de agentes das Forças Armadas, da Polícia Federal, da Polícia Rodoviária Federal, da Força Nacional e da fiscalização ambiental para atuar de forma repressiva e preventiva no combate aos incêndios no Pantanal e na Amazônia. Tal medida é complementar à execução dos julgamentos das ADPFs 743, 746 e 857 – julgadas no fim de março.
É fundamental que ações como essa existam visando que o país não atinja o “ponto do não retorno”, contudo, mesmo diante de políticas públicas que vêm sendo desenvolvidas nesse sentido, cada vez mais, parece ficar evidente, que o principal problema no enfrentamento das queimadas é a ausência de educação ambiental que, por si só, deveria ser a principal política pública.